Convenção Europeia para a Proteção dos Direitos Humanos e Liberdades Fundamentais

Todos os 47 estados membro do Conselho da Europa ratificaram a Convenção Europeia para a Protecção dos Direitos Humanos e das Liberdades Fundamentais. As disposições relevantes incluem a proibição de tortura e "tratamento ou punição desumana ou degradante" (artigo 3) e garantias dos direitos à vida privada e em família (artigo 8), um remédio eficaz (artigo 13) e não discriminação (artigo 14).

O Tribunal Europeu dos Direitos Humanos tem progressivamente condenado as punições corporais, numa série de julgamentos desde os anos 70.[1] Em Tyrer v RU (1978, disponível em inglês), levado a tribunal por uma criança de 15 anos na Ilha do Homem, o tribunal decidiu que as vergastadas a que ele tinha sido sujeitado constituíam "punição degradante" no âmbito do significado do artigo 3 da Convenção. O Tribunal não examinou a questão de se também houvera uma violação do direito do requerente à não discriminação com base no sexo e/ou idade (devido às disposições legais que permitem especificamente as punições corporais judiciais às pessoas de sexo masculino com menos de 21 anos). Em seguida ao julgamento, aqueles com poder de dar sentenças de punição corporal na Ilha do Homem foram informadas pelo Governo de que as punições corporais judiciais violavam a Convenção Europeia, embora tenha sido 23 anos antes, em 2001, a legislação que permitia a imposição de sentenças de punição corporal foi revogada.

A legalidade das punições corporais escolares no RU foi desafiada em Campbell e Cosans v RU (1982, disponível em inglês), Y v RU (1992, disponível em inglês), Costello-Roberts v RU (1993, disponível em inglês) e outros requerimentos:

  • Em Campbell e Cosans v RU, levado a tribunal por duas mães cujos filhos frequentavam escolas onde corriam o risco de sofrer punições corporais, o Tribunal deliberou que o direito a garantir a educação dos filhos em conformidade com as próprias convicções filosóficas (artigo 2 do Protocolo Nº 1 da Convenção) tinha sido violado. O Tribunal deliberou que como nenhuma das crianças tinha sido sujeita a punições corporais, não tinha havido violação alguma do artigo 3. Uma das crianças tinha sido suspendida da escola quando se recusou a aceitar uma punição corporal; o Tribunal deliberou que esta suspensão tinha violado o direito da criança à educação segundo o artigo 2 do Protocolo Nº1 da Convenção.
  • Em Costello-Roberts v RU, o Tribunal deliberou que a punição corporal aplicada na escola a uma criança de sete anos não violava o artigo 3 ou artigo 8, apesar de declarar que não desejava ser interpretado como aprovando a retenção das punições corporais na escola.
  • Em Y v RU e outros requerimentos, o Governo do RU "comprou" o requerente, pagando uma soma concordada para evitar que o caso fosse a tribunal (designados "acordos amigáveis"). Apesar disso, as punições corporais foram eventualmente proibidas em todas as escolas estatais em 1986, sendo a proibição ampliada para abranger as escolas privadas em Inglaterra e no País de Gales em 1998, na Escócia no ano 2000, e na Irlanda do Norte em 2003.

Também houve decisões importantes declarando inadmissíveis os requerimentos que desafiavam as proibições de punições corporais em casa e nas escolas (Philip Williamson e outros v RU (2000)). Em Sete Indivíduos v Suécia  (1982), a Comissão Europeia dos Direitos Humanos (um tribunal especial que até 1998 tomou decisões sobre a admissibilidade dos requerimentos ao Tribunal) decidiu que uma reclamação por sete pais de que a proibição de 1979 da Suécia de todas as punições corporais das crianças violavam os direitos ao respeito pela vida privada e de família, liberdade de religião e de garantir a educação dos filhos em conformidade com as respectivas convicções era inadmissível. A Comissão decidiu que o facto de que a legislação proporcionava proteção igual às crianças e adultos contra agressão não podia ser declarada como consituindo uma "interferência" nas vidas privada e de família dos requerentes.

Em A v RU (1998, disponível em inglês), o primeiro julgamento sobre punição corporal parental, o Tribunal decidiu que o direito do requerente de nove anos "A" à proteção contra tratamento desumano ou degradante tinha sido violado, e o Governo do RU era responsável devido à legislação que permitia "castigos razoáveis". O Tribunal decidiu que as punições corporais aplicadas ao requerente, que tinha sido espancado duramente em diversas ocasiões com uma vergasta, eram suficientemente severas para constituir uma violação do artigo 3, e que uma vez que o padrasto do requerente, que tinha aplicado o castigo, tinha sido absolvido de ter cometido uma agressão causando danos corporais reais com base no facto de a punição constituir um "castigo razoável", o Governo não tinha proporcionado proteção adequada ao requerente o que constituía uma violação do artigo 3.

O Tribunal revisitou a questão de punições corporais parentais em Wetjen v Alemanha (2018, disponível em inglês), decidindo que o Governo alemão não tinha violado o direito do requerente ao respeito pela vida privada e de família (artigo 8) ao retirar partes da autoridade dos pais e colocando as crianças sob os cuidados da assistência social para evitar que fossem sistematicamente vergastadas. Em vez disso, decidiu que se tinha chegado a um equilíbrio justo entre os interesses dos pais e os melhores interesses dos filhos, uma vez que o direito dos pais a comunicar e promover as próprias convicçõs religiosas ao educar os filhos não pode expôr os filhos a práticas perigosas ou a danos físicos ou psicológicos. O Tribunal também declarou que era "louvável" os estados proibirem na legislação todas as formas de punições corporais das crianças, "com o fim de evitar todos os riscos de maus-tratos e tratamento degradante das crianças".

No entanto, o Tribunal ainda tem de produzir um julgamento claro condenando todas as punições corporais de crianças sem excepção - defendendo o direito das crianças à proteção igual no âmbito da legislação sobre agressões.

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Todos os julgamentos do Tribunal Europeu de Direitos Humanos estão disponíveis na base de dados da HUDOC (disponível em inglês, francês, russo e espanhol). A base de dados Theseus (disponível em inglês e francês) inclui a jurisprudência do Tribunal relacionada com os direitos das crianças.

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